JACARTA/CAMBRIDGE, MASSACHUSETTS – Para além do seu impacto sanitário e dos seus custos humanos, a pandemia da COVID-19 está a ameaçar reverter muita da evolução conseguida na redução da pobreza pelos países em desenvolvimento, nos últimos 20 anos. É necessário um novo e substancial investimento para proteger aqueles a quem a crise atingiu mais severamente. Tal como as economias avançadas, muitos países em desenvolvimento anunciaram a criação ou o alargamento de programas para evitar o colapso económico e impedir a generalização da fome. Mas muitos não conseguiram aproximar-se da escala do investimento testemunhado nos Estados Unidos e noutros países desenvolvidos. Pelo menos 100 países já solicitaram ajuda ao Fundo Monetário Internacional.
Um tipo prometedor de financiamento ainda não recebeu atenção suficiente. O colapso dos preços do petróleo representa uma oportunidade única para eliminar, de uma vez por todas, os subsídios aos combustíveis fósseis. Isto não ajudaria apenas a luta contra as alterações climáticas. Também permitiria aos governos orientarem mais recursos para os desfavorecidos e para o financiamento da dívida provocada pela crise.
Durante décadas, muitos países (do Equador à Indonésia) subsidiaram a gasolina e outros combustíveis, normalmente através da fixação dos preços pagos nas bombas. Ao abrigo desta política, quando os preços do petróleo sobem, o subsídio governamental também sobe, mas o preço nas bombas permanece inalterado.
Historicamente, os subsídios aos combustíveis têm gozado de grande popularidade no mundo em desenvolvimento, onde a importância da economia informal e a falta de registos dificultam a identificação dos mais desfavorecidos pelos governos. Antes do advento do dinheiro móvel e dos serviços bancários alargados, o fornecimento directo de dinheiro ou alimentos aos cidadãos tendia a abrir a porta à corrupção. Os subsídios aos combustíveis ofereciam uma solução para este problema, porque toda a gente conseguia beneficiar se comprasse gasolina, e esse benefício estava claramente definido como o preço nas bombas.
O problema, evidentemente, é que os subsídios a combustíveis encorajam a sobreutilização de combustíveis, o que tem implicações ambientais terríveis. Em vez de subsidiar os combustíveis, salientam frequentemente os economistas, deveríamos taxá-lo de modo a resolver essas externalidades. Um estudo recente estima que a eliminação dos subsídios para petróleo e gás poderia ter reduzido as emissões globais de carbono em 5-6% em 2015, e em 28% se os subsídios ao carvão também tivessem sido eliminados.
Os subsídios a combustíveis também são um modo ineficiente de ajudar os desfavorecidos, especialmente agora, que estão disponíveis métodos melhores de direccionamento e distribuição de benefícios. Embora as famílias desfavorecidas e da classe média baixa beneficiem com o combustível subsidiado, as famílias da classe média e mais abastadas beneficiam mais, porque tendem a comprar mais combustível. Segundo uma análise de 2015 desenvolvida pelo FMI, os 20% de famílias mais ricas recebem seis vezes mais benefícios em subsídios a combustíveis que os 20% de famílias mais pobres. E os subsídios a combustíveis são frequentemente muitíssimo dispendiosos, especialmente quando os preços do petróleo estão elevados. Por exemplo, em 2018 a Indonésia gastou 3,1% do PIB em subsídios a combustíveis, mas apenas 1,4% do PIB na saúde.
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Apesar das suas falhas evidentes, estas políticas persistiram em muitos países. Em tempos normais, a eliminação de um subsídio a combustíveis significa que o preço do combustível subirá drasticamente, provocando frequentemente protestos generalizados. Também pode promover a inflação, se todas as pessoas interpretarem a subida dos preços dos combustíveis como um sinal para ajustar outros preços.
Mas estes não são tempos normais. Embora as consequências económicas da pandemia tenham afectado a maioria dos mercados financeiros, o abalo sobre os preços globais do petróleo foi especialmente dramático. Os preços reais (ajustados pela inflação) do crude caíram pelo menos para metade, dos cerca de 60 USD por barril antes da crise para os cerca de 25-30 USD por barril de hoje. A determinada altura durante a crise da COVID, os preços do petróleo atingiram o seu nível mais baixo desde a II Guerra Mundial.
Isto representa uma oportunidade sem precedentes para eliminar de uma vez por todas os subsídios a combustíveis. Os preços muito baixos do petróleo significam que muitos países poderiam permitir que o mercado definisse os preços do combustível sem desencadear alterações de preço nas bombas. E assim que a procura global de petróleo (e os preços) recuperarem, estes países deixarão de estar dependentes de milhares de milhões de dólares em subsídios a combustíveis todos os anos. Essas poupanças poderiam ser canalizadas para o reembolso das dívidas incorridas em consequência da COVID-19, e para financiar programas de assistência social que servirão para o futuro. De forma igualmente importante, estes países deixariam de subsidiar de forma activa a crise climática.
Os governos deveriam permitir que os preços dos combustíveis flutuassem livremente antes que se encerre a actual janela de oportunidade. A Indonésia já aprendeu esta lição, e da forma mais difícil. Em 2008, após o declínio dos preços mundiais do petróleo provocado pela crise financeira, o governo reduziu os subsídios a combustíveis e ajustou os preços nacionais dos combustíveis, mas manteve fixos os preços dos combustíveis. Quando os preços do petróleo subiram durante a recuperação, o governo teve de começar subitamente a gastar milhares de milhões de dólares em subsídios a combustíveis.
Este ciclo repetiu-se poucos anos depois. Enquanto ministro das finanças da Indonésia em 2013, um de nós (Basri) propôs reduzir o subsídio nacional a combustíveis e deixar que o preço dos combustíveis flutuasse. Mas embora o governo estivesse disposto a dar o primeiro passo, acabou por decidir mais uma vez pela manutenção dos preços fixos. Quando os preços do petróleo subiram, a companhia petrolífera estatal foi obrigada a gastar milhares de milhões de dólares em subsídios.
Os preços historicamente baixos do petróleo nos dias de hoje permitem alterações que ajudariam a atenuar as alterações climáticas durante muito tempo no futuro. A eliminação de subsídios também libertaria os orçamentos governamentais quando os preços dos combustíveis começassem a subir. Os governos dos países em desenvolvimento têm de aproveitar a ocasião, tanto para ajudar a financiar a resposta à pandemia como para providenciar transferências direccionadas às pessoas que delas mais necessitem.
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The Norwegian finance ministry recently revealed just how much the country has benefited from Russia's invasion of Ukraine, estimating its windfall natural-gas revenues for 2022-23 to be around $111 billion. Yet rather than transferring these gains to those on the front line, the government is hoarding them.
argue that the country should give its windfall gains from gas exports to those on the front lines.
JACARTA/CAMBRIDGE, MASSACHUSETTS – Para além do seu impacto sanitário e dos seus custos humanos, a pandemia da COVID-19 está a ameaçar reverter muita da evolução conseguida na redução da pobreza pelos países em desenvolvimento, nos últimos 20 anos. É necessário um novo e substancial investimento para proteger aqueles a quem a crise atingiu mais severamente. Tal como as economias avançadas, muitos países em desenvolvimento anunciaram a criação ou o alargamento de programas para evitar o colapso económico e impedir a generalização da fome. Mas muitos não conseguiram aproximar-se da escala do investimento testemunhado nos Estados Unidos e noutros países desenvolvidos. Pelo menos 100 países já solicitaram ajuda ao Fundo Monetário Internacional.
Um tipo prometedor de financiamento ainda não recebeu atenção suficiente. O colapso dos preços do petróleo representa uma oportunidade única para eliminar, de uma vez por todas, os subsídios aos combustíveis fósseis. Isto não ajudaria apenas a luta contra as alterações climáticas. Também permitiria aos governos orientarem mais recursos para os desfavorecidos e para o financiamento da dívida provocada pela crise.
Durante décadas, muitos países (do Equador à Indonésia) subsidiaram a gasolina e outros combustíveis, normalmente através da fixação dos preços pagos nas bombas. Ao abrigo desta política, quando os preços do petróleo sobem, o subsídio governamental também sobe, mas o preço nas bombas permanece inalterado.
Historicamente, os subsídios aos combustíveis têm gozado de grande popularidade no mundo em desenvolvimento, onde a importância da economia informal e a falta de registos dificultam a identificação dos mais desfavorecidos pelos governos. Antes do advento do dinheiro móvel e dos serviços bancários alargados, o fornecimento directo de dinheiro ou alimentos aos cidadãos tendia a abrir a porta à corrupção. Os subsídios aos combustíveis ofereciam uma solução para este problema, porque toda a gente conseguia beneficiar se comprasse gasolina, e esse benefício estava claramente definido como o preço nas bombas.
O problema, evidentemente, é que os subsídios a combustíveis encorajam a sobreutilização de combustíveis, o que tem implicações ambientais terríveis. Em vez de subsidiar os combustíveis, salientam frequentemente os economistas, deveríamos taxá-lo de modo a resolver essas externalidades. Um estudo recente estima que a eliminação dos subsídios para petróleo e gás poderia ter reduzido as emissões globais de carbono em 5-6% em 2015, e em 28% se os subsídios ao carvão também tivessem sido eliminados.
Os subsídios a combustíveis também são um modo ineficiente de ajudar os desfavorecidos, especialmente agora, que estão disponíveis métodos melhores de direccionamento e distribuição de benefícios. Embora as famílias desfavorecidas e da classe média baixa beneficiem com o combustível subsidiado, as famílias da classe média e mais abastadas beneficiam mais, porque tendem a comprar mais combustível. Segundo uma análise de 2015 desenvolvida pelo FMI, os 20% de famílias mais ricas recebem seis vezes mais benefícios em subsídios a combustíveis que os 20% de famílias mais pobres. E os subsídios a combustíveis são frequentemente muitíssimo dispendiosos, especialmente quando os preços do petróleo estão elevados. Por exemplo, em 2018 a Indonésia gastou 3,1% do PIB em subsídios a combustíveis, mas apenas 1,4% do PIB na saúde.
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Mas estes não são tempos normais. Embora as consequências económicas da pandemia tenham afectado a maioria dos mercados financeiros, o abalo sobre os preços globais do petróleo foi especialmente dramático. Os preços reais (ajustados pela inflação) do crude caíram pelo menos para metade, dos cerca de 60 USD por barril antes da crise para os cerca de 25-30 USD por barril de hoje. A determinada altura durante a crise da COVID, os preços do petróleo atingiram o seu nível mais baixo desde a II Guerra Mundial.
Isto representa uma oportunidade sem precedentes para eliminar de uma vez por todas os subsídios a combustíveis. Os preços muito baixos do petróleo significam que muitos países poderiam permitir que o mercado definisse os preços do combustível sem desencadear alterações de preço nas bombas. E assim que a procura global de petróleo (e os preços) recuperarem, estes países deixarão de estar dependentes de milhares de milhões de dólares em subsídios a combustíveis todos os anos. Essas poupanças poderiam ser canalizadas para o reembolso das dívidas incorridas em consequência da COVID-19, e para financiar programas de assistência social que servirão para o futuro. De forma igualmente importante, estes países deixariam de subsidiar de forma activa a crise climática.
Os governos deveriam permitir que os preços dos combustíveis flutuassem livremente antes que se encerre a actual janela de oportunidade. A Indonésia já aprendeu esta lição, e da forma mais difícil. Em 2008, após o declínio dos preços mundiais do petróleo provocado pela crise financeira, o governo reduziu os subsídios a combustíveis e ajustou os preços nacionais dos combustíveis, mas manteve fixos os preços dos combustíveis. Quando os preços do petróleo subiram durante a recuperação, o governo teve de começar subitamente a gastar milhares de milhões de dólares em subsídios a combustíveis.
Este ciclo repetiu-se poucos anos depois. Enquanto ministro das finanças da Indonésia em 2013, um de nós (Basri) propôs reduzir o subsídio nacional a combustíveis e deixar que o preço dos combustíveis flutuasse. Mas embora o governo estivesse disposto a dar o primeiro passo, acabou por decidir mais uma vez pela manutenção dos preços fixos. Quando os preços do petróleo subiram, a companhia petrolífera estatal foi obrigada a gastar milhares de milhões de dólares em subsídios.
Os preços historicamente baixos do petróleo nos dias de hoje permitem alterações que ajudariam a atenuar as alterações climáticas durante muito tempo no futuro. A eliminação de subsídios também libertaria os orçamentos governamentais quando os preços dos combustíveis começassem a subir. Os governos dos países em desenvolvimento têm de aproveitar a ocasião, tanto para ajudar a financiar a resposta à pandemia como para providenciar transferências direccionadas às pessoas que delas mais necessitem.