CAMBRIDGE – O Mecanismo de Ajuste de Carbono nas Fronteiras(Carbon Border Adjustment Mechanism - CBAM, na sigla original em inglês) da União Europeia, lançado oficialmente em outubro de 2023, exige agora que os importadores relatem as emissões diretas e indiretas de gases de efeito estufa (GEE) embutidas nos bens que importam. A partir de janeiro de 2026, a UE começará a impor tarifas sobre importações de países que não precificarem o carbono à taxa de mercado do bloco, o que pode afetar de modo significativo os produtores intensivos em carbono entre seus parceiros comerciais.
O novo regime de precificação de carbono da UE pode parecer uma potencial fonte de discórdia internacional, somando-se à já lotada agenda de desafios globais assustadores. Mas uma análise mais detalhada sugere que o CBAM pode representar o caminho global mais eficaz para se atingir as metas ambiciosas de redução de emissões do acordo climático de Paris.
Em 1994, quando a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas entrou em vigor, estava claro que conseguir que os países concordassem com limites às emissões de GEE e cumprissem esses limites seria extremamente difícil devido aos custos econômicos significativos. Embora mecanismos de mercado, como a precificação de carbono ou permissões negociáveis de emissão, fossem vistos como uma maneira promissora de minimizar esses custos, muitos acreditavam que eles nunca funcionariam porque a opinião pública na maioria dos países era muito menos favorável a abordagens baseadas no mercado do que nos Estados Unidos.
Além disso, não havia uma maneira plausível de incentivar ou fiscalizar acordos de redução de carbono, pois a hipótese era que muitos países simplesmente se recusariam a esta violação implícita de sua soberania nacional. Considerando-se o problema dos que pegavam carona nessa desculpa, proclamações internacionais de metas climáticas ambiciosas eram amplamente esperadas como promessas vazias.
Trinta anos depois, a situação mudou. Em 2005, a UE estabeleceu com sucesso seu sistema de comércio de emissões, que funciona como um mercado aberto para a negociação de permissões de emissão. Agora, o CBAM – projetado para evitar “vazamentos” quando indústrias regulamentadas transferem a produção de países com regras ambientais rígidas para aqueles com regulamentos mais lenientes – pode ser a chave para estabelecer um regime global de precificação de carbono.
Pelo CBAM, os países que não taxam seus GEE enfrentarão, na prática, tarifas sobre suas exportações para a UE em seis setores “piloto” intensivos em carbono: alumínio, ferro e aço, cimento, fertilizantes, hidrogênio e eletricidade. Mais indústrias serão incluídas até 2030. Os importadores terão de comprar permissões de importação, cujo custo será igual ao preço de mercado do carbono dentro da UE – €77 (US$ 83,9) por tonelada a partir de 23 de maio – menos qualquer preço de carbono que os fornecedores paguem em seus próprios países.
Ao taxar as emissões de GEE, o CBAM na prática dará aos parceiros comerciais da UE que exportam bens intensivos em carbono um incentivo poderoso para estabelecer mecanismos de precificação de carbono e CBAMs próprios. Isso permitiria aos governos participantes coletar receitas - que, de outra forma, seriam coletadas pelos governos europeus - que poderiam usar para investir em prioridades domésticas, financiar projetos de desenvolvimento verde e cobrir lacunas fiscais. À medida que mais países aderirem, deve aumentar a pressão econômica sobre os que resistem a seguir o exemplo.
Embora alguns possam argumentar que tais penalidades comerciais são incompatíveis com as regras da Organização Mundial do Comércio e poderiam ser usadas para apoiar políticas protecionistas, a UE afirma que isso não acontecerá com o CBAM. Especificamente, o design não-discriminatório do mecanismo deve torná-lo consistente com as regras da OMC.
A maioria dos países está apenas começando a formular respostas políticas ao CBAM. Em dezembro, o Reino Unido, que tem seu próprio mercado interno de emissões, decidiu seguir seus vizinhos continentais e adotar um mecanismo semelhante de ajuste de fronteira. A Turquia também está desenvolvendo sua própria taxa de fronteira de carbono, e Austrália e Canadá têm cogitado medidas semelhantes.
Enquanto isso, no Senado dos EUA, propostas para estruturas tipo CBAM podem ser parte de um movimento na direção certa. Sem definir um preço nacional interno para o carbono, contudo, tal sistema seria discriminatório.
Empresas americanas argumentarão que já pagam um alto preço implícito pelo carbono devido às emissões médias menores de GEE. As empresas siderúrgicas dos EUA, por exemplo, utilizam principalmente fornos elétrico a arco, que emitem muito menos dióxido de carbono do que os altos-fornos usados em muitos outros países exportadores, como China, Rússia, Ucrânia, Coreia do Sul, Índia e Canadá. Porém, sem estabelecer um preço nacional explícito para o carbono, é improvável que o CBAM americano seja consistente com as regras do comércio internacional.
A proliferação de impostos sobre o carbono pode ter profundas implicações para economias emergentes e em desenvolvimento. Embora países como China, Índia e África do Sul tenham desafiado o CBAM, o novo regime da UE pode levá-los a desenvolver seus próprios mecanismos de precificação de carbono para mitigar o impacto sobre suas exportações e PIB.
Sem dúvida, os impostos de fronteira sobre o carbono podem servir apenas como desculpas para proteger indústrias domésticas das importações. Mas se implementados de maneira eficaz, os países lidando com cobranças do CBAM podem eventualmente – embora com relutância – responder adotando regimes robustos de precificação de carbono. Essa pode ser a melhor chance que o mundo tem para facilitar as mudanças necessárias na produção e no consumo tecnológico para evitar uma mudança climática catastrófica.
Agradeço a Kimberly Clausing, Robert Stavins e Catherine Wolfram pelos comentários úteis.
Tradução por Fabrício Calado Moreira
CAMBRIDGE – O Mecanismo de Ajuste de Carbono nas Fronteiras(Carbon Border Adjustment Mechanism - CBAM, na sigla original em inglês) da União Europeia, lançado oficialmente em outubro de 2023, exige agora que os importadores relatem as emissões diretas e indiretas de gases de efeito estufa (GEE) embutidas nos bens que importam. A partir de janeiro de 2026, a UE começará a impor tarifas sobre importações de países que não precificarem o carbono à taxa de mercado do bloco, o que pode afetar de modo significativo os produtores intensivos em carbono entre seus parceiros comerciais.
O novo regime de precificação de carbono da UE pode parecer uma potencial fonte de discórdia internacional, somando-se à já lotada agenda de desafios globais assustadores. Mas uma análise mais detalhada sugere que o CBAM pode representar o caminho global mais eficaz para se atingir as metas ambiciosas de redução de emissões do acordo climático de Paris.
Em 1994, quando a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas entrou em vigor, estava claro que conseguir que os países concordassem com limites às emissões de GEE e cumprissem esses limites seria extremamente difícil devido aos custos econômicos significativos. Embora mecanismos de mercado, como a precificação de carbono ou permissões negociáveis de emissão, fossem vistos como uma maneira promissora de minimizar esses custos, muitos acreditavam que eles nunca funcionariam porque a opinião pública na maioria dos países era muito menos favorável a abordagens baseadas no mercado do que nos Estados Unidos.
Além disso, não havia uma maneira plausível de incentivar ou fiscalizar acordos de redução de carbono, pois a hipótese era que muitos países simplesmente se recusariam a esta violação implícita de sua soberania nacional. Considerando-se o problema dos que pegavam carona nessa desculpa, proclamações internacionais de metas climáticas ambiciosas eram amplamente esperadas como promessas vazias.
Trinta anos depois, a situação mudou. Em 2005, a UE estabeleceu com sucesso seu sistema de comércio de emissões, que funciona como um mercado aberto para a negociação de permissões de emissão. Agora, o CBAM – projetado para evitar “vazamentos” quando indústrias regulamentadas transferem a produção de países com regras ambientais rígidas para aqueles com regulamentos mais lenientes – pode ser a chave para estabelecer um regime global de precificação de carbono.
Pelo CBAM, os países que não taxam seus GEE enfrentarão, na prática, tarifas sobre suas exportações para a UE em seis setores “piloto” intensivos em carbono: alumínio, ferro e aço, cimento, fertilizantes, hidrogênio e eletricidade. Mais indústrias serão incluídas até 2030. Os importadores terão de comprar permissões de importação, cujo custo será igual ao preço de mercado do carbono dentro da UE – €77 (US$ 83,9) por tonelada a partir de 23 de maio – menos qualquer preço de carbono que os fornecedores paguem em seus próprios países.
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Ao taxar as emissões de GEE, o CBAM na prática dará aos parceiros comerciais da UE que exportam bens intensivos em carbono um incentivo poderoso para estabelecer mecanismos de precificação de carbono e CBAMs próprios. Isso permitiria aos governos participantes coletar receitas - que, de outra forma, seriam coletadas pelos governos europeus - que poderiam usar para investir em prioridades domésticas, financiar projetos de desenvolvimento verde e cobrir lacunas fiscais. À medida que mais países aderirem, deve aumentar a pressão econômica sobre os que resistem a seguir o exemplo.
Embora alguns possam argumentar que tais penalidades comerciais são incompatíveis com as regras da Organização Mundial do Comércio e poderiam ser usadas para apoiar políticas protecionistas, a UE afirma que isso não acontecerá com o CBAM. Especificamente, o design não-discriminatório do mecanismo deve torná-lo consistente com as regras da OMC.
A maioria dos países está apenas começando a formular respostas políticas ao CBAM. Em dezembro, o Reino Unido, que tem seu próprio mercado interno de emissões, decidiu seguir seus vizinhos continentais e adotar um mecanismo semelhante de ajuste de fronteira. A Turquia também está desenvolvendo sua própria taxa de fronteira de carbono, e Austrália e Canadá têm cogitado medidas semelhantes.
Enquanto isso, no Senado dos EUA, propostas para estruturas tipo CBAM podem ser parte de um movimento na direção certa. Sem definir um preço nacional interno para o carbono, contudo, tal sistema seria discriminatório.
Empresas americanas argumentarão que já pagam um alto preço implícito pelo carbono devido às emissões médias menores de GEE. As empresas siderúrgicas dos EUA, por exemplo, utilizam principalmente fornos elétrico a arco, que emitem muito menos dióxido de carbono do que os altos-fornos usados em muitos outros países exportadores, como China, Rússia, Ucrânia, Coreia do Sul, Índia e Canadá. Porém, sem estabelecer um preço nacional explícito para o carbono, é improvável que o CBAM americano seja consistente com as regras do comércio internacional.
A proliferação de impostos sobre o carbono pode ter profundas implicações para economias emergentes e em desenvolvimento. Embora países como China, Índia e África do Sul tenham desafiado o CBAM, o novo regime da UE pode levá-los a desenvolver seus próprios mecanismos de precificação de carbono para mitigar o impacto sobre suas exportações e PIB.
Sem dúvida, os impostos de fronteira sobre o carbono podem servir apenas como desculpas para proteger indústrias domésticas das importações. Mas se implementados de maneira eficaz, os países lidando com cobranças do CBAM podem eventualmente – embora com relutância – responder adotando regimes robustos de precificação de carbono. Essa pode ser a melhor chance que o mundo tem para facilitar as mudanças necessárias na produção e no consumo tecnológico para evitar uma mudança climática catastrófica.
Agradeço a Kimberly Clausing, Robert Stavins e Catherine Wolfram pelos comentários úteis.
Tradução por Fabrício Calado Moreira