CIDADE DO CABO – Os chefes de estado e de governo africanos estão reunidos na cimeira anual da União Africana (UA), e as questões relacionadas com o crescimento e o desenvolvimento económicos constituem a primeira linha do debate. Mas os líderes também têm de garantir que a sua agenda para o crescimento fique vinculada ao desafio global da acção urgente contra as alterações climáticas. Isto é especialmente crítico para África, que é desproporcionalmente vulnerável aos efeitos do aquecimento global: o aumento da frequência e da gravidade de tempestades tropicais, de secas e de cheias, que nos últimos anos devastaram comunidades e economias africanas.
Dados os riscos climáticos enfrentados por África, talvez não surpreenda ver o continente tomar a dianteira na formulação de um futuro sustentável. Dos 108 países que até agora sinalizaram o reforço dos seus compromissos climáticos em 2020, tal como exigido pelo acordo de Paris, 47 estão em África. Estes países reconhecem as oportunidades de saltar etapas no sentido de um modelo de crescimento novo, mais limpo e mais eficiente, e os riscos de não seguirem esse caminho.
Além disso, em Novembro de 2019 o Banco Africano de Desenvolvimento (BAD) anunciou que deixará de financiar novas centrais a carvão no futuro. Esta reorientação reflecte a crescente competitividade das tecnologias renováveis e a emergência de novos modelos de negócio. Combinados com investimentos em aparelhos, equipamentos, alojamentos e edifícios comerciais com maior eficiência energética, estes desenvolvimentos podem eliminar em África a necessidade de mais energia produzida a partir do carvão.
O BAD contribui para a dinâmica crescente, em toda a comunidade do financiamento para o desenvolvimento, no apoio à transição para uma economia de baixo teor de carbono e ao afastamento do carvão. Mais de 100 instituições financeiras globais, crescentemente preocupadas com os riscos climáticos, já desinvestiram do carvão térmico, incluindo 16 dos 40 maiores bancos internacionais, e um número ainda maior está a limitar os seus investimentos em novas unidades a carvão.
O abandono do carvão não é somente bom para o clima, mas também para a economia e a população de África. Em muitas regiões, a energia renovável é agora mais barata que o carvão, mesmo sem subsídios. Os aspectos económicos são ainda mais favoráveis se considerarmos os custos ocultos dos problemas de saúde originados pelo carvão, do risco de retenção de activos, e do vultuoso investimento inicial necessário ao denominado carvão limpo. Pura e simplesmente, não existe qualquer sentido económico no investimento em novas unidades a carvão.
Com efeito, 42% das centrais a carvão de todo o mundo estão a perder dinheiro, e África não está imune a esta tendência. Os custos da energia primária para a Eskom, o operador público de electricidade da África do Sul, dispararam 300% em termos reais durante os últimos 20 anos, originando graves problemas financeiros e tarifas mais elevadas para os clientes. Uma análise do projecto de Plano de Recursos Integrados (PRI) de 2016 para o sistema energético da África do Sul concluiu que a opção de menor custo não era o carvão, mas antes uma combinação de energia solar fotovoltaica, de energia eólica e de geradores de energia flexível como centrais hidroeléctricas, de biogás, ou de gás. Em resposta, o PRI de 2018 confirmou o abandono do carvão pelas energias renováveis. Outros países africanos que tentem seguir o caminho da África do Sul provavelmente chegarão a situações semelhantes.
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Inclusivamente, a transição para as renováveis pode melhorar o acesso à energia de modo rápido e económico, ao mesmo tempo que evita a poluição atmosférica. Entre 1990 e 2013, as mortes anuais em África devidas à poluição do ar exterior aumentaram 36%, para cerca de 250.000. A energia renovável descentralizada ou desligada da rede pode reduzir as emissões nocivas, e ajudar as comunidades africanas rurais a satisfazer necessidades privadas e públicas básicas de energia. O acesso alargado à electricidade também pode reforçar a igualdade de género ao apoiar actividades empresariais geridas por mulheres, com casos de aumentos de onze vezes nos rendimentos auferidos pelas mulheres.
Os benefícios de uma transição para longe do carvão são evidentes. Mas à medida que África for avançando num rumo de baixo carbono, também terá de investir mais na eficiência energética e evitar tornar-se excessivamente dependente do gás natural, do petróleo ou mesmo dos projectos hidroeléctricos de maior escala, que estão todos altamente expostos a riscos financeiros relacionados com o clima. Sinais políticos contraditórios podem originar biliões de dólares de retenções em activos de combustíveis fósseis até 2035, correspondentes a uma perda de até 15% do PIB a valores actuais. E as alterações climáticas já estão a ameaçar algumas instalações hidroeléctricas africanas de grande dimensão, pondo em causa a sua fiabilidade e viabilidade financeira no longo prazo.
Mas, apesar das vantagens económicas e sociais das renováveis, ainda se planeiam novas centrais a carvão por toda a África. Com os projectos de início previsto no Zimbabué, no Senegal, na Nigéria e em Moçambique, a capacidade energética produzida a partir do carvão do continente poderia aumentar dos actuais três gigawatts para perto de 17 GW até 2040.
Os países africanos encontram-se num momento decisivo em termos da escolha do seu modo de desenvolvimento. Os governos deviam intensificar estratégias e políticas destinadas a encorajar a transição para uma nova economia climática e a aumentar o investimento na energia limpa.
Conseguir esta transição para uma economia de baixo carbono e resistente é essencial para se cumprir a ambiciosa Agenda 2063 da UA para o desenvolvimento inclusivo e sustentável. E ao abandonar os combustíveis fósseis, África pode dar o exemplo no esforço global do combate às alterações climáticas.
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Over time, as American democracy has increasingly fallen short of delivering on its core promises, the Democratic Party has contributed to the problem by catering to a narrow, privileged elite. To restore its own prospects and America’s signature form of governance, it must return to its working-class roots.
is not surprised that so many voters ignored warnings about the threat Donald Trump poses to US institutions.
Enrique Krauze
considers the responsibility of the state to guarantee freedom, heralds the demise of Mexico’s democracy, highlights flaws in higher-education systems, and more.
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CIDADE DO CABO – Os chefes de estado e de governo africanos estão reunidos na cimeira anual da União Africana (UA), e as questões relacionadas com o crescimento e o desenvolvimento económicos constituem a primeira linha do debate. Mas os líderes também têm de garantir que a sua agenda para o crescimento fique vinculada ao desafio global da acção urgente contra as alterações climáticas. Isto é especialmente crítico para África, que é desproporcionalmente vulnerável aos efeitos do aquecimento global: o aumento da frequência e da gravidade de tempestades tropicais, de secas e de cheias, que nos últimos anos devastaram comunidades e economias africanas.
Dados os riscos climáticos enfrentados por África, talvez não surpreenda ver o continente tomar a dianteira na formulação de um futuro sustentável. Dos 108 países que até agora sinalizaram o reforço dos seus compromissos climáticos em 2020, tal como exigido pelo acordo de Paris, 47 estão em África. Estes países reconhecem as oportunidades de saltar etapas no sentido de um modelo de crescimento novo, mais limpo e mais eficiente, e os riscos de não seguirem esse caminho.
Além disso, em Novembro de 2019 o Banco Africano de Desenvolvimento (BAD) anunciou que deixará de financiar novas centrais a carvão no futuro. Esta reorientação reflecte a crescente competitividade das tecnologias renováveis e a emergência de novos modelos de negócio. Combinados com investimentos em aparelhos, equipamentos, alojamentos e edifícios comerciais com maior eficiência energética, estes desenvolvimentos podem eliminar em África a necessidade de mais energia produzida a partir do carvão.
O BAD contribui para a dinâmica crescente, em toda a comunidade do financiamento para o desenvolvimento, no apoio à transição para uma economia de baixo teor de carbono e ao afastamento do carvão. Mais de 100 instituições financeiras globais, crescentemente preocupadas com os riscos climáticos, já desinvestiram do carvão térmico, incluindo 16 dos 40 maiores bancos internacionais, e um número ainda maior está a limitar os seus investimentos em novas unidades a carvão.
O abandono do carvão não é somente bom para o clima, mas também para a economia e a população de África. Em muitas regiões, a energia renovável é agora mais barata que o carvão, mesmo sem subsídios. Os aspectos económicos são ainda mais favoráveis se considerarmos os custos ocultos dos problemas de saúde originados pelo carvão, do risco de retenção de activos, e do vultuoso investimento inicial necessário ao denominado carvão limpo. Pura e simplesmente, não existe qualquer sentido económico no investimento em novas unidades a carvão.
Com efeito, 42% das centrais a carvão de todo o mundo estão a perder dinheiro, e África não está imune a esta tendência. Os custos da energia primária para a Eskom, o operador público de electricidade da África do Sul, dispararam 300% em termos reais durante os últimos 20 anos, originando graves problemas financeiros e tarifas mais elevadas para os clientes. Uma análise do projecto de Plano de Recursos Integrados (PRI) de 2016 para o sistema energético da África do Sul concluiu que a opção de menor custo não era o carvão, mas antes uma combinação de energia solar fotovoltaica, de energia eólica e de geradores de energia flexível como centrais hidroeléctricas, de biogás, ou de gás. Em resposta, o PRI de 2018 confirmou o abandono do carvão pelas energias renováveis. Outros países africanos que tentem seguir o caminho da África do Sul provavelmente chegarão a situações semelhantes.
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Os benefícios de uma transição para longe do carvão são evidentes. Mas à medida que África for avançando num rumo de baixo carbono, também terá de investir mais na eficiência energética e evitar tornar-se excessivamente dependente do gás natural, do petróleo ou mesmo dos projectos hidroeléctricos de maior escala, que estão todos altamente expostos a riscos financeiros relacionados com o clima. Sinais políticos contraditórios podem originar biliões de dólares de retenções em activos de combustíveis fósseis até 2035, correspondentes a uma perda de até 15% do PIB a valores actuais. E as alterações climáticas já estão a ameaçar algumas instalações hidroeléctricas africanas de grande dimensão, pondo em causa a sua fiabilidade e viabilidade financeira no longo prazo.
Mas, apesar das vantagens económicas e sociais das renováveis, ainda se planeiam novas centrais a carvão por toda a África. Com os projectos de início previsto no Zimbabué, no Senegal, na Nigéria e em Moçambique, a capacidade energética produzida a partir do carvão do continente poderia aumentar dos actuais três gigawatts para perto de 17 GW até 2040.
Os países africanos encontram-se num momento decisivo em termos da escolha do seu modo de desenvolvimento. Os governos deviam intensificar estratégias e políticas destinadas a encorajar a transição para uma nova economia climática e a aumentar o investimento na energia limpa.
Conseguir esta transição para uma economia de baixo carbono e resistente é essencial para se cumprir a ambiciosa Agenda 2063 da UA para o desenvolvimento inclusivo e sustentável. E ao abandonar os combustíveis fósseis, África pode dar o exemplo no esforço global do combate às alterações climáticas.