NOVA IORQUE – “Não parece que tenhamos quaisquer valores comuns com os quais concordemos, nem objectivos comuns aos quais aspiremos”. O presidente ganês Nana Akufo-Addo acertou em cheio quando fez esta observação durante o seu discurso na Assembleia-Geral das Nações Unidas da passada semana. Numa altura em que se agravam crises interligadas, a ordem internacional parece estar cada vez mais fracturada, e existe uma incerteza profunda sobre o papel da própria ONU. Onde conseguiremos encontrar o ímpeto e a orientação necessários para restaurar o multilateralismo?
A resposta a esta pergunta exige um entendimento mais aprofundado das atitudes, preocupações e esperanças das pessoas de todo o mundo. Para este efeito, a Open Society Foundations, a organização filantrópica a que presido, produziu recentemente um dos maiores estudos sobre a opinião pública global alguma vez feitos. O nosso Barómetro Open Society inquiriu mais de 36.000 pessoas, oriundas de um grupo diversificado de 30 países que representam aproximadamente dois terços da população mundial.
De certa forma, as respostas vieram clarificar os valores e objectivos unificadores que estão manifestamente ausentes do actual sistema de governação global. Mostram que as pessoas de todo o mundo ainda depositam fé na democracia mas, numa era de crises e desigualdades, querem que a mesma produza melhorias concretas no decurso das suas vidas.
Os resultados de África foram especialmente marcantes. Oito dos 30 países que inquirimos – Egipto, Etiópia, Gana, Quénia, Nigéria, Senegal, África do Sul e Tunísia – estão no continente. Evidentemente que as respostas a algumas perguntas variaram significativamente, em consequência das diferentes circunstâncias históricas e políticas. Por exemplo, 63% dos egípcios acreditam que um regime militar é uma forma adequada para gerir um país, comparativamente a 40% dos etíopes e apenas 20% dos senegaleses. Ao mesmo tempo, uma percentagem ainda maior de egípcios anseia pela democracia; evidentemente, não têm a certeza se a sua curta experiência democrática pode considerar-se bem-sucedida.
Em especial, apesar de a maioria dos inquiridos nos 30 países que sondámos exprimir sentimentos de insegurança e de desigualdade, estes sentimentos foram mais pronunciados em África. Do mesmo modo, os inquiridos do continente ficaram entre os mais ansiosos quanto ao impacto negativo das alterações climáticas sobre as suas vidas e os seus meios de subsistência. No Quénia e na Etiópia, por exemplo, 83% dos inquiridos expressaram preocupações deste tipo.
Dos cinco países onde o nosso inquérito considerou haver maior receio que a instabilidade política desse lugar à violência durante o próximo ano, quatro estão em África: Quénia, África do Sul, Nigéria e Senegal. Os inquiridos africanos foram também quem mais afirmou que as desigualdades entre países são hoje um desafio mais importante do que eram em 2022. Este sentimento é mais forte na Etiópia, no Quénia e no Senegal, mas todos os oito países africanos ficaram na metade superior desse gráfico.
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De modo semelhante, apesar de uma maioria de inquiridos na maior parte dos países partilhar determinadas opiniões relativas à necessidade de mudanças globais, essas maiorias foram geralmente mais expressivas em África. Por exemplo, os inquiridos africanos, liderados pelos participantes na Nigéria e no Quénia, foram os mais propensos a dizer que “os direitos humanos reflectem valores em que acredito” e entre os mais propensos a concordar que “ferramentas como as proibições de viagens e o congelamento de contas bancárias são formas úteis de aplicar justiça a violadores de direitos humanos”.
Os africanos, mais do que os inquiridos de outros continentes, concordam em que os países devem criar mais rotas seguras e legais para refugiados. Apoiaram firmemente o reajustamento das instituições internacionais, e muitos defenderam que os países de baixos rendimentos tivessem uma maior influência na tomada de decisões globais. Sete dos dez grupos nacionais que mais concordaram com a afirmação “os países de rendimentos elevados deveriam dar mais dinheiro ao Banco Mundial” são oriundos de África.
No seu conjunto, estes resultados sugerem que África seja como o resto do mundo – talvez de uma forma mais expressiva. Como o continente está nas linhas da frente das chamadas “policrises”, os africanos sentem as suas pressões de forma mais imediata que a maioria. Mas também são os que maior probabilidade têm de adoptar as soluções necessárias, como a reformulação das estruturas de governação globais e a arquitectura financeira internacional, a estabilização da actual e caótica interdependência e a realização de novos e importantes investimentos no desenvolvimento sustentável.
A nível global, o inquérito sugere que as pessoas têm expectativas relativas ao multilateralismo muito mais pronunciadas do que as dos seus líderes políticos. As pessoas querem soluções internacionais eficazes para os problemas urgentes das suas vidas. Não existe lugar onde isto seja mais verdadeiro do que em África.
Para aqueles de nós que procuram defensores e ideias futuras para reformas multilaterais, é evidente que temos de ir além dos suspeitos do costume (governos ocidentais que protegem com grande entusiasmo o seu poder e os seus privilégios) e, em vez disso, ir beber à fonte do Sul Global. É aqui que o futuro reside.
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If UK Chancellor of the Exchequer Rachel Reeves tried to meet all the political demands that have been placed on her, her budget would likely result in disappointing growth and financial instability. Instead, the new government's first budget should be judged according to four longer-term criteria.
lists four criteria for assessing the chancellor's attempt to meet a long list of unrealistic demands.
At COP16 in Colombia this month, delegates from nearly 200 countries will discuss how to accelerate action to protect 30% of the planet’s land and maritime areas by 2030. Central to that goal will be unlocking more investment through public-private partnerships, de-risking mechanisms, and other innovative strategies.
points out that biodiversity loss and ecosystem damage jeopardize all other global development goals.
NOVA IORQUE – “Não parece que tenhamos quaisquer valores comuns com os quais concordemos, nem objectivos comuns aos quais aspiremos”. O presidente ganês Nana Akufo-Addo acertou em cheio quando fez esta observação durante o seu discurso na Assembleia-Geral das Nações Unidas da passada semana. Numa altura em que se agravam crises interligadas, a ordem internacional parece estar cada vez mais fracturada, e existe uma incerteza profunda sobre o papel da própria ONU. Onde conseguiremos encontrar o ímpeto e a orientação necessários para restaurar o multilateralismo?
A resposta a esta pergunta exige um entendimento mais aprofundado das atitudes, preocupações e esperanças das pessoas de todo o mundo. Para este efeito, a Open Society Foundations, a organização filantrópica a que presido, produziu recentemente um dos maiores estudos sobre a opinião pública global alguma vez feitos. O nosso Barómetro Open Society inquiriu mais de 36.000 pessoas, oriundas de um grupo diversificado de 30 países que representam aproximadamente dois terços da população mundial.
De certa forma, as respostas vieram clarificar os valores e objectivos unificadores que estão manifestamente ausentes do actual sistema de governação global. Mostram que as pessoas de todo o mundo ainda depositam fé na democracia mas, numa era de crises e desigualdades, querem que a mesma produza melhorias concretas no decurso das suas vidas.
Os resultados de África foram especialmente marcantes. Oito dos 30 países que inquirimos – Egipto, Etiópia, Gana, Quénia, Nigéria, Senegal, África do Sul e Tunísia – estão no continente. Evidentemente que as respostas a algumas perguntas variaram significativamente, em consequência das diferentes circunstâncias históricas e políticas. Por exemplo, 63% dos egípcios acreditam que um regime militar é uma forma adequada para gerir um país, comparativamente a 40% dos etíopes e apenas 20% dos senegaleses. Ao mesmo tempo, uma percentagem ainda maior de egípcios anseia pela democracia; evidentemente, não têm a certeza se a sua curta experiência democrática pode considerar-se bem-sucedida.
Em especial, apesar de a maioria dos inquiridos nos 30 países que sondámos exprimir sentimentos de insegurança e de desigualdade, estes sentimentos foram mais pronunciados em África. Do mesmo modo, os inquiridos do continente ficaram entre os mais ansiosos quanto ao impacto negativo das alterações climáticas sobre as suas vidas e os seus meios de subsistência. No Quénia e na Etiópia, por exemplo, 83% dos inquiridos expressaram preocupações deste tipo.
Dos cinco países onde o nosso inquérito considerou haver maior receio que a instabilidade política desse lugar à violência durante o próximo ano, quatro estão em África: Quénia, África do Sul, Nigéria e Senegal. Os inquiridos africanos foram também quem mais afirmou que as desigualdades entre países são hoje um desafio mais importante do que eram em 2022. Este sentimento é mais forte na Etiópia, no Quénia e no Senegal, mas todos os oito países africanos ficaram na metade superior desse gráfico.
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Os africanos, mais do que os inquiridos de outros continentes, concordam em que os países devem criar mais rotas seguras e legais para refugiados. Apoiaram firmemente o reajustamento das instituições internacionais, e muitos defenderam que os países de baixos rendimentos tivessem uma maior influência na tomada de decisões globais. Sete dos dez grupos nacionais que mais concordaram com a afirmação “os países de rendimentos elevados deveriam dar mais dinheiro ao Banco Mundial” são oriundos de África.
No seu conjunto, estes resultados sugerem que África seja como o resto do mundo – talvez de uma forma mais expressiva. Como o continente está nas linhas da frente das chamadas “policrises”, os africanos sentem as suas pressões de forma mais imediata que a maioria. Mas também são os que maior probabilidade têm de adoptar as soluções necessárias, como a reformulação das estruturas de governação globais e a arquitectura financeira internacional, a estabilização da actual e caótica interdependência e a realização de novos e importantes investimentos no desenvolvimento sustentável.
A nível global, o inquérito sugere que as pessoas têm expectativas relativas ao multilateralismo muito mais pronunciadas do que as dos seus líderes políticos. As pessoas querem soluções internacionais eficazes para os problemas urgentes das suas vidas. Não existe lugar onde isto seja mais verdadeiro do que em África.
Para aqueles de nós que procuram defensores e ideias futuras para reformas multilaterais, é evidente que temos de ir além dos suspeitos do costume (governos ocidentais que protegem com grande entusiasmo o seu poder e os seus privilégios) e, em vez disso, ir beber à fonte do Sul Global. É aqui que o futuro reside.