O Milagre de Mazowiecki

VARSÓVIA – Era um dia quente e um momento tenso. Quando o primeiro primeiro-ministro da Polónia pós-comunista, Tadeusz Mazowiecki, apresentava o inovador programa do seu governo, vacilou e pareceu desmaiar. Enquanto o parlamento apinhado especulava nervosamente, Mazowiecki deslizou por uma saída lateral para apanhar algum ar fresco no vizinho Parque Ujazdowski, no centro de Varsóvia.

“Quem é aquele?” perguntou uma criança, que brincava numa caixa de areia, à sua mãe. “Nasz premier”, respondeu-lhe ela – “O nosso primeiro-ministro”. Esta não era uma frase que fosse frequentemente usada para descrever os líderes Comunistas da Polónia durante as quatro décadas anteriores.

Quando Mazowiecki regressou ao pódio, pediu desculpas e, com o seu costumado humor seco, sugeriu que a economia Polaca estava tão instável como ele. Tinha razão.

O comunismo deixara a Polónia na bancarrota política e económica. A ideologia marxista tinha-se tornado numa fachada; nem mesmo os membros do aparelho partidário fingiam acreditar nela. A economia da Polónia, próxima do colapso completo, esforçava-se por satisfazer as necessidades básicas dos cidadãos, quanto mais reembolsar os empréstimos estrangeiros.

Coube ao jornalista Católico e activista da oposição Mazowiecki ser o primeiro primeiro-ministro não-Comunista da Polónia moderna e começar o caminho para a recuperação. Embora tenha ocupado o cargo durante menos de 17 meses, de Agosto de 1989 a Janeiro de 1991, ele conseguiu colocar a Polónia num caminho para a economia de mercado e para a adesão à OTAN e à União Europeia.

Nas últimas semanas do regime Comunista, Mazowiecki ajudou a estabelecer um modelo para a transição política negociada que ainda hoje informa, inspira e guia outras sociedades que se encontrem na cúspide da mudança. Sinto-me orgulhoso porque a Polónia, graças à experiência ganha nos anos de Mazowiecki e posteriores, pode dar conselhos aos seus vizinhos orientais e meridionais da União Europeia, bem como a países como a Tunísia e a Birmânia.

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O magro, cavalheiresco Mazowiecki fora conselheiro de Lech Wałęsa, o líder do movimento Solidariedade. Vira o movimento crescer até mais de nove milhões de membros nos dias arrebatados que se seguiram à greve dos Estaleiros de Gdansk em Agosto de 1980 – e, como o resto da liderança do movimento, fora detido quando o General Wojciech Jaruzelski declarou a lei marcial e baniu o Solidariedade, 16 meses mais tarde. O sindicato sobreviveu como uma operação clandestina, imprimindo documentos de reflexão e organizando comícios.

Gradualmente, o saldo da vantagem afastou-se da liderança Comunista – especialmente depois de Mikhail Gorbachev ter sido eleito líder Soviético – e aproximou-se novamente do Solidariedade. Exausto, o regime Comunista Polaco concordou em conversações com o Solidariedade. As negociações, conhecidas como Debates da Mesa Redonda, levaram à primeira eleição parlamentar competitiva – embora não completamente livre – do mundo Comunista, a 4 de Junho de 1989.

Cinco meses antes da queda do Muro de Berlim e da Revolução de Veludo da Checoslováquia, a Polónia tinha negociado o seu caminho para longe do totalitarismo. Mas o governo de Mazowiecki enfrentava uma tarefa quase impossível: construir instituições políticas democráticas ao mesmo tempo que ressuscitava a entorpecida economia do país.

Uma das maiores conquistas da equipa de Mazowiecki foi a introdução, liderada pelo Ministro das Finanças Leszek Balcerowicz, de reformas de mercado e de nacionalizações rápidas e de longo alcance. A “terapia de choque” do Plano Balcerowicz desestabilizou os Polacos, mas colocou sob controlo a terrivelmente elevada inflação do país. Mazowiecki apoiou Balcerowicz, e o sucesso da reforma económica sustentou a relativamente suave transição política da Polónia.

Na verdade, apesar de alguns soluços iniciais, os efeitos positivos da reforma económica foram rapidamente notados. A Polónia registou um crescimento impressionante. Em 20 anos, o PIB quadruplicou, enquanto as exportações mais que decuplicaram. Antes um país Europeu periférico do ponto de vista económico e político, a Polónia tornou-se um dos principais estados da Europa e um co-modelador do seu futuro.

Os Debates da Mesa Redonda e a transição política supervisionada por Mazowiecki marcaram um período de compromisso que teve vantagens e desvantagens. As vantagens incluíram uma rápida mudança política e o apoio de alguma da antiga elite Comunista na construção de um estado livre, democrático, e pró-Ocidental.

As desvantagens incluíram a falta de uma ruptura clara entre o passado autoritário da Polónia e o seu presente democrático. O preço de uma transição suave também implicou que muitos membros do regime Comunista – incluindo Jaruzelski – não tenham sido responsabilizados pelos crimes que cometeram enquanto detinham o poder.

Na altura, eu era crítico do caminho que Mazowiecki tomava. Acreditava que a transformação da Polónia podia conseguir-se mais rapidamente e mais eficazmente. Mas isto nunca manchou a excelente a opinião que tinha dele. Pelo contrário, olhando para essa era, é espantoso como tanto foi conseguido num tão curto espaço de tempo.

Juntamente com Wałęsa, Mazowiecki foi um fundador da independência Polaca. O seu lugar nos livros de história está garantido. É graças a ele que os Polacos podem estar orgulhosos de o seu país ter sido o primeiro do Bloco Soviético a libertar-se da tirania Comunista. Não olhámos para trás desde então.

Traduzido do inglês por António Chagas

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