eichengreen91_Sam Yeh_Getty Sam Yeh/Getty Images

Reescalonar a montanha da dívida Chinesa

MONTREAL – Existe consenso geral sobre dois factos relativos à economia Chinesa. Primeiro, o abrandamento terminou e o crescimento está a melhorar. Segundo, financeiramente nem tudo está bem. Mas não existe consenso sobre o que acontece a seguir.

A boa notícia é que a procura interna continua a crescer. As vendas de automóveis subiram quase 10% em Março relativamente ao mês homólogo de 2015. E as vendas a retalho cresceram a um ritmo anual de 10% no primeiro trimestre.

O aumento mais significativo, todavia, é no investimento. O investimento imobiliário está novamente a crescer, depois do seu colapso em 2015. O investimento industrial, especialmente em empresas estatais, tem apresentado franca recuperação.

Na base desta reviravolta está um enorme crescimento do crédito, já que o governo, preocupado com a dimensão do anterior abrandamento, encoraja os bancos Chineses a emprestar. O crescimento do crédito, conhecido na China como “financiamento social total”, evoluiu a uma taxa anual de 13% no quarto trimestre de 2015 e no primeiro trimestre do ano corrente, ou seja, ao dobro da taxa anual de crescimento do PIB. Desde que a crise financeira eclodiu em Setembro de 2008, a China teve o crescimento de crédito mais rápido que qualquer país no mundo. Na verdade, é difícil encontrar outra expansão de crédito desta dimensão na história documentada.

A má notícia é que as expansões de crédito raramente acabam bem, como nos lembram os economistas Moritz Schularick e Alan Taylor. O tsunami de crédito Chinês financia investimentos na siderurgia e no imobiliário, sectores já sobrecarregados por uma enorme capacidade excedentária. As empresas que estão a contrair empréstimos, por outras palavras, são precisamente as que têm menor capacidade de reembolso.

O Fundo Monetário Internacional, que tende a adoptar uma postura conservadora em questões deste teor (em particular para evitar o confronto com governos poderosos), estima que estejam em risco 15% dos empréstimos Chineses a sociedades não financeiras. Com a dívida das sociedades não financeiras actualmente nos 150% do PIB, o valor contabilístico do crédito mal parado pode chegar a um quarto do rendimento nacional.

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Ainda poderá ser possível vender apartamentos desocupados por uma fracção do seu custo de construção. Poderá ser possível vender ao desbarato maquinaria de laminagem a outros países, ou como sucata. Mas os sectores em que se concentram os empréstimos em risco (na siderurgia, mineração, e no imobiliário) sugerem que as perdas serão substanciais.

É por isso que a solução supostamente indolor, da conversão de dívida em capital, não será indolor. Sim, os créditos em incumprimento podem ser adquiridos por empresas de gestão de activos, que podem embalá-los e vendê-los a outros investidores. Mas se os gestores de activos suportarem o valor contabilístico total desses empréstimos, incorrerão em perdas, e o governo terá de pagar a factura. Se suportarem apenas o seu valor de mercado, serão os bancos quem incorrerão em perdas, e o governo terá de sanear os seus balanços.

Isto deixa três opções desagradáveis. Primeiro, as autoridades podem emitir obrigações para angariar o financiamento necessário à recapitalização dos seus bancos. Ao fazê-lo, acabariam por transformar o problema da dívida das empresas num problema de dívida pública. Isto colocaria a carga financeira directamente sobre os ombros dos contribuintes futuros, o que não melhoraria a confiança dos consumidores.

Também não melhoraria a confiança nas finanças públicas. A dívida pública é ainda relativamente reduzida na China; mas, como poderá dizer qualquer cidadão da Irlanda, pode subir em flecha quando surgem crises no sector bancário.

Em alternativa, o banco central poderia financiar o saneamento, concedendo mais crédito. Mas embora o governo se tenha baseado nesta abordagem em 1999, quando enfrentou pela última vez um problema de crédito mal parado, pôr a funcionar as impressoras de dinheiro não é compatível com o outro objectivo declarado dos responsáveis: uma taxa de câmbio estável. Vimos no passado mês de Agosto como podem os investidores entrar em pânico quando a taxa de câmbio do renmibi se altera inesperadamente. A desvalorização cambial pode não só precipitar uma desestabilizadora espiral de fuga de capitais; pode também desestabilizar os bancos, de onde o deve primeiro ser levantado o dinheiro que sai do país.

A última opção consiste em imaginar que o problema do crédito mal parado se resolverá sozinho. Os bancos seriam encorajados a “prolongar” os seus empréstimos: a renová-los quando vencesse o reembolso. Manter-se-ia a ficção de que os bancos apresentam bons níveis de capitalização. Os devedores que precisassem de ser liquidados ou reorganizados permaneceriam em vez disso vivos, graças ao gotejamento do financiamento bancário. O resultado pareceria familiar aos aficionados da crise do sector bancário do Japão: bancos mortos-vivos que emprestam a empresas mortas-vivas, que exercem pressão artificial sobre empresas viáveis, reprimindo o seu crescimento.

O financiamento da recapitalização dos bancos através da emissão de obrigações será provavelmente a opção menos má. Isto não quer dizer que será indolor. Nem de que exista qualquer garantia de que os responsáveis políticos Chineses optem nesse sentido. Mas se não o fizerem, as consequências poderão ser graves.

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